Revdo. Pe Jorge Aquino
Se há uma realidade inarredável de nossas vidas hoje é a da onipresença das tecnologias ligadas à internet e à comunicação. Parece que as crianças de hoje já nascem “chipadas” e com um conhecimento muitas vezes superior à de seus pais, no quesito manusear um computador ou um “smartfone”.
Sabemos que, de uma perspectiva tecnológica, o mundo passou por uma grande mudança em meados do século XVIII com a Revolução Industrial. Muito da vida cotidiana das pessoas foi afetada pela energia à vapor, pelas novas tecnologias têxteis e pelo incremento de novas máquinas e ferramentas.
Da 2º metade do século XIX até a 1ª Guerra Mundial o mundo assistiu a 2ª Revolução Industrial, também chamada de Revolução Tecnológica. Com ela tivemos a produção de ferro e aço em alta escala; a utilização do petróleo e de produtos químicos; o desenvolvimento da energia elétrica e, com ela, da comunicação.
A 3ª Revolução Industrial é chamada de Revolução Digital e é marcada pela substituição de uma realidade analógica, mecânica e eletrônica por tecnologias digitais que surgem em meados do século XX, chegando até ao desenvolvimentos dos PC’s e arquivos digitais oriundos do Vale do Cilício. Foi com a década de 90 que as coisas parecem ter dado um “boom” e atingido proporções nunca antes imaginadas.
Hoje, este mundo da hiperinformação, exerce uma enorme influência sobre nossas vidas, nossos relacionamentos e nossos comportamentos. Parece que, de uma perspectiva filosófica, nós voltamos ao dualismo platônico que dividida o mundo entre o mundo das ideias e o mundo real.
Para Platão, o mundo das ideias era perfeito, pleno e servia de modelo para o mundo real, que era apenas uma “sombra” imperfeita daquele mundo superior e eterno. Hoje, também estamos divididos entre e vida digital e a real. E, à semelhança dos filósofos platônicos, acreditamos que o mundo real é apenas uma “sombra” daquilo que é muito mais importante, o mundo digital.
Nossa comunicação foi afetada por essa crença. Não há como negar que as relações humanas foram afetadas pelo surgimento da internet. Não olhamos mais nos olhos das pessoas. Temos que ter um smartfone, um tablete, um netbook ou notebook para poder acessar as outras pessoas. Sem isso estamos perdidos no mundo.
Além do mais, precisamos estar conectados em algum tipo de “rede social” tal como o facebook para que tenhamos existência. Quem não tem um, não “existe”. Ademais, se para existir nesse mundo temos que ter o facebook, temos que utilizá-lo para que todos saibam onde estamos e o que estamos fazendo. Pior, sem ele não teríamos “amigos” e ninguém “curtiria” nossas postagens. Imagine a pessoa que conseguiu chegar a ter 2.000 amigos no facebook. Agora imagine o que aconteceria se ela postasse algo e ninguém, nenhum de seus 2.000 amigos curtisse ou compartilhasse sua postagem. Você tem ideia da depressão que isso pode gerar em uma pessoa que vive no mundo digital? Isto é real! Há estudos que mostram que pessoas entram em depressão se suas postagens não forem “curtidas”. Até que ponto chegamos?! Não se engane, você não tem 2.000 “amigos”. Você está só em um mundo de ícones, informação e bytes. Seja sincero consigo mesmo, se você tiver muitos amigos, terá, no máximo, uns quatro ou cinco. O resto não conta pra nada.
Conheço inúmeras pessoas que já nem falam pelo telefone. Não adianta ligar. Elas só estarão disponíveis pelo WhatsApp. E mesmo a linguagem não é mais escrita em língua corrente, mas em um código cifrado que envolve contrações de palavras e a utilização de “emojis”. Concordo com a opinião de Noam Chomsky, quando diz: “(…) diz-se que aumenta a comunicação entre as pessoas. Mas trata-se de uma comunicação muito superficial. O que os jovens têm que aprender é a relacionar-se uns com os outros como seres humanos. Isto implica estar frente a frente. Nós não somos marcianos! (…) os jovens relacionam-se com pessoas imaginárias. E nesse sentido a internet é um perigo porque cria a ilusão de que se está em contacto com outros quando, na realidade, se está completamente isolado” (sic) (CHOMSKY, In CAVALCANTI. s.d. p. 40). Esta é a grande mudança que está ocorrendo na comunicação mundial. Estamos vivendo em um mundo de relacionamentos superficiais onde a profundidade está cada vez mais perdida.
Este é o mundo que é valorizado em nossa geração. O mundo onde os fatos só são verdades se fazem parte e aparecem no mundo virtual. O real não nos interessa mais. O toque, o cheiro, o olhar, o tom da voz, tudo isso foi substituído pelo teclado de seu smartfone e pela “conexão” que o WhatsApp promete proporcionar.
Afinal, não estaríamos mesmo ressuscitando o dualismo platônico? Será que nosso tempo, dinheiro, atenção, enfim, será que toda a nossa vida não está voltada hoje para o mundo digital? Será que nosso sonho de consumo não é comprar o novo lançamento da Apple? Se nossa resposta for positiva, então realmente podemos começar a ter uma séria preocupação com o futuro de nossos filhos e de nossa humanidade. Sim, porque diante de nós, nos espera um mundo onde as dores reais e concretas de nada valerão; um mundo onde os valores mais cobiçados estarão relacionados ao consumismo e à aquisição, ao invés da justiça, da solidariedade e do amor. Quem viver verá.